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Edição de Moda 2012

Os Sapatos Fazem o Homem

Igor Dewe ganhou notoriedade por usar shortinhos de lycra e plataformas enquanto rebolava os quadris e ensaboava limusines de jornalistas esnobes que chegavam à Semana de Moda de Paris.

Fotos por Maciek Pozoga
Imagens de Arquivo Cortesia de Igor Dewe

O Igor passeando em Montmartre, Paris, usando seus sapatos de latinha, um monte de tecido que ele encontrou e um colete tradicional da Croácia.

Igor Dewe é o tipo de injeção de alegria que a moda precisa: um francês peludo de 21 anos que ganhou notoriedade por usar shortinhos de lycra coloridos tie-dye, plataformas e um chapéu turco enquanto rebolava os quadris e ensaboava limusines de jornalistas esnobes que chegavam à Semana de Moda de Paris. O Igor é dançarino, artista performático, ativista de moda e estilista, e faz os calçados mais originais e malucos que já vimos. Estamos falando de plataformas de 40 centímetros de altura feitas com frutas, latinhas, castelos de areia, cera de vela e folhas. Além de fazer os sapatos com as próprias mãos, ele também cria roupas e performances artísticas igualmente espetaculares. Por exemplo, em uma performance que fez em Belo Horizonte ele enganchou um espremedor de laranja na virilha e chamou as pessoas para tomar o néctar que pingava por uma mangueira de plástico. Obviamente, tivemos que conversar com o Igor pelo bem das pobres almas tristes da indústria da moda, e do mundo em geral.

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VICE: Oooooooi, Igor. De onde vêm as ideias para os seus sapatos malucos?
Igor Dewe: Sei lá. Eu simplesmente brinco com tudo que encontro e trabalho muito com conceitos. Comecei a fazer sapatos porque não dava para ficar comprando sapatos Yves Saint Laurent e Christian Louboutin. Construí meu primeiro par com paletes de madeira, e depois fiz um par com latinhas. Meu pai tem um ateliê onde ele solda peças de avião. Uso os equipamentos dele para fazer sapatos mais fortes, estruturados e masculinos. Então você acredita que homens podem usar salto e ainda assim ficarem masculinos?
Sim! Pegue sapatos ortopédicos, por exemplo. Eles fazem maravilhas para pessoas com pés deformados. Acho o conceito desses sapatos interessante, você não sabe onde está o pé, então dá para alongar a silhueta sem ninguém perceber. Acho genial isso de permitir que você mude seu corpo de acordo com os seus desejos. Eu adoraria ter pernas supercompridas e bonitas, mas um par de sapatos ortopédicos feitos especialmente para mim custaria uns 6 mil euros. Então faço minhas próprias versões. Como é possível andar em cima de um salto de 40 cm?
Na verdade, é muito fácil, mas às vezes são pesados e me machuco com eles. Gosto do desafio de andar por aí com os meus sapatos. Não tenho medo de cair, simplesmente saio andando. Às vezes preciso voltar para casa porque fica escorrendo muito sangue e não consigo andar. Seus sapatos estão à venda?
Acho que não conseguiria vendê-los, porque são muito frágeis e levo séculos para construí-los.

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Por que tanto trabalho se não tem um retorno financeiro?
Quando vejo fotos das minhas performances, digo: “Será que estou maluco? Por que fui fazer uma coisa dessa?”. Acho que tenho uma necessidade psicológica de atuar e criar. Se eu não me desafio, se não construo esses sapatos que esboço ou faço uma performance e um vídeo, fico deprimido e me sinto um fracasso. É como um desejo, um impulso sexual. Você não sabe o que vai acontecer quando estiver fazendo uma performance na rua, e é essa carga de adrenalina que eu busco. Isso faz com que eu me sinta vivo.

O Igor contou que usa os sapatos de plataforma metálicos de salto alto (acima à direita) em orgias com seus amigos robôs e depois coloca os sapatos de vela (acima à esquerda) para pedir perdão por seus pecados. Ele passou dois dias produzindo os sapatos de fruta (imagem inferior) que você também pode ver no vídeo Vendendo Meu Suco. Você tem algum agente ou galeria que te represente?
Não. Gostaria de conseguir visibilidade, mas sou péssimo de marketing e comunicação. Como assim? Você é o gênio do marketing. A performance que você fez em frente ao último desfile do Galliano pela Dior, vestido de imperador romano com sapatos de plataforma altíssimos, segurando flores e uma placa que dizia “O rei se foi”,  foi uma ação de marketing brilhante. Você deve ter planejado muito bem aquilo.
Embora o Galliano tenha dito coisas terríveis e mereça o que aconteceu com ele, ainda assim quis homenageá-lo pelas suas realizações. O Galliano e o Jean Paul Gaultier são meus estilistas preferidos, porque dão vida nova ao folclore e a culturas esquecidas numa mistura moderna de glamour étnico. Alguns amigos do Galliano vieram até mim e me agradeceram. Não sei se o Galliano me viu, mas saí em muitos jornais. Até o Boy George falou de mim no blog dele. Por que você começou a fazer essas performances?
Fiz novos amigos há alguns anos e começamos a nos divertir muito. Por fim, eles vieram morar comigo. Foi assim que conheci a Maja Bergström, que faz os meus vídeos. Precisávamos de dinheiro para pagar o aluguel, então começamos a fazer performances sob a alcunha de House of Drama. Já nos apresentamos em clubes, feiras de arte, eventos de moda e até no Festival de Cannes. Ainda me apresento com eles, mas também gosto de ter meus próprios projetos. Qual foi sua primeira performance solo?
"Piedade Financeira", na qual eu pedia dinheiro ao lado das passarelas durante a Semana de Moda de Paris com uma roupa inspirada em ciganos e sapatos de plataforma Nina Ricci. Adoro moda, mas a semana de moda virou um megaevento comercial e fajuto, com vigilância policial e segurança máxima. Senti um grande desejo de protestar, de manchar aquele universo perfeito de luxo e beleza, para o qual somente a elite é convidada, e trazê-lo de volta à realidade. Eu queria lembrar às pessoas que a moda também acontece do lado de fora, nas ruas. A segunda performance que fiz foi um protesto contra os editores-chefes e jornalistas de moda que se consideram estrelas e chegam de limusine no evento. Resolvi zoar com o carro deles. Você está falando da performance que está documentada no vídeo Fashion Carwash? Adoro esse vídeo, principalmente a parte em que o segurança joga o balde de água e sabão em você.
Sim, o segurança e eu tivemos uma briguinha. A moda se tornou muito séria e chata. Eu queria levar um pouco de humor para aquilo tudo. Reparei que quase todas as suas performances são interativas de alguma maneira. Você convida os transeuntes a se envolverem.
Sim, a interação com o público é importante para mim. Gosto de trabalhar com a rua e de testar a reação das pessoas. Se elas ficam irritadas, nervosas, felizes ou curiosas quando me veem, isso cria uma conexão que eu gosto muito. O Igor passou séculos juntando conchas para esses sapatos, e gastou tubos e tubos de Super Bonder para deixá-los firmes, mas mesmo assim eles se desfizeram na água. Agora eles só existem no vídeo Castelinho de Areia.

É engraçado o fato de a maioria das suas performances acontecerem em Paris, porque os parisienses são notoriamente cruéis com quem se destaca intencionalmente na multidão.
É verdade. A atmosfera em Paris não é exatamente amigável. Sinto que as pessoas estão ficando mais sombrias e isso me assusta. Parece que alguma coisa sinistra está para acontecer. Talvez seja apenas a crise econômica, mas tenho a sensação horripilante de que o fascismo está voltando. Só me apresento quando tenho coragem. É muito comum eu ficar deprimido e sentir que ninguém precisa de mim. Com certeza precisamos de você.
Mas sempre faço performances quando viajo. É um ótimo jeito de conhecer um país novo. Da última vez que estive em Nova York, fiz performances todos os dias. Foi incrível. porque as pessoas eram muito positivas. Eu me senti o Mickey Mouse. Adoraria voltar aos Estados Unidos, mas no momento não posso, porque recentemente me botaram na cadeia por uma noite depois de uma das minhas performances na Art Basel, em Miami. Você foi preso? Por quê?
Sim, foi horrível. Era para eu fazer uma performance em uma noite da Le Baron [uma balada parisiense] em um hotel, mas tinha tanta gente do lado de fora que não consegui entrar. Tentei a entrada de funcionários nos fundos, mas os guardas me jogaram com violência na calçada. Depois seis seguranças vieram e me imobilizaram. Quando a polícia chegou, tentei explicar o que tinha acontecido e que eu deveria me apresentar, mas disseram que não estavam nem aí e que não se usava saltos como os meus nas ruas daquela cidade. E aí me botaram na cadeia. Você foi preso por usar salto alto?
Sim, foi muito louco isso. É comum você ser incomodado pela polícia e por seguranças durante suas performances?
Sim, o tempo todo! É muito irritante e desgastante, e agora preciso ter autorização se quiser fazer uma performance. Mas são só roupas e sapatos. Você não pode se vestir do jeito que quiser?
Não. Mesmo se estiver usando um tapete e uma minissaia, ameaçam me prender porque estou “pelado”. Mas não estou pelado! Também gosto de protestar por motivos políticos, mas sempre acabo tendo problemas com a polícia. O último protesto político que fiz foi a performance "Greve de Roupas para Salvar o Mundo", em que andei com folhas, flores e sapatos de plataforma no estilo Grécia antiga. O que você vai fazer agora?
Não sei. Estou tentando me perguntar o que quero fazer, mas é difícil. Quando vejo todos os sapatos que já criei, penso que talvez um dia eu possa fazer uma exposição com eles e com os vídeos. Seria legal.

Para ver mais sapatos do Igor e assistir alguns dos seus vídeos hilários, visite www.igordewe.com.